sexta-feira, 15 de maio de 2009

Castro Máximo arrasado pelo novo Estádio Municipal de Braga

Este é um caso que assenta que nem uma luva na linha geral do nosso Projecto: a relação entre a construção e a preservação do património. Trata-se do Castro Máximo, um povoado fortificado proto-histórico, classificado como monumento nacional que, devido à construção do novo Estádio Municipal de Braga, projectado por Souto Moura (também já com o estatuto de monumento nacional), foi quase completamente destruído. Construiu-se património contemporâneo, mas destruiu-se património antigo.

Para o vice-presidente da Câmara de Braga, Nuno Alpoim, não restam dúvidas de que o património construído tem que ser preservado, potenciando-se a sua musealização, para que possa ser fruído. No entanto, sustenta que essa não é a única perspectiva que existe, uma vez que uma das funções de quem decide também passa pela construção de património: “Nós temos, por um lado, que preservar o património mas, por outro, temos o direito e o dever de criar património. E esta é outra vertente”. Nesse sentido, refere o novo estádio municipal como “obra emblemática” e “um dos exemplos daquilo que se pretende”, já que, “ao mesmo tempo que se conserva aquilo que vem do passado, promove-se a criação de elementos patrimoniais da modernidade” (ver vídeo).

Em declarações ao nosso Projecto, o responsável pelo Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal de Braga (GACMB), Armandino Cunha, refere que o Castro Máximo está classificado como monumento nacional, "pelo que dispõe de uma área de protecção". Foi por isso que, quando da construção do estádio, “teve que haver um desvio ao projecto inicial”.

Tratando-se de um local referido em várias publicações (ver sítio da Geira), pelo menos até à construção do novo equipamento desportivo que o Castro Máximo nunca terá sido objecto de escavações sistemáticas, mas apenas de sondagens esporádicas. Destas, destacam-se duas, realizadas em 1977 e 1978 pela Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho (UAUM).

O responsável do GACMB refere que, na sequência das obras de construção do estádio, procederam-se a mais trabalhos arqueológicos, tendo-se encontrado novos vestígios datados da Idade do Ferro. Só que estes foram considerados como “não relevantes e semelhantes a tantos outros encontrados noutros locais”, pelo que se recolheram e depositaram no Museu D. Diogo de Sousa Museu D. Diogo de Sousa.
No seguimento de um parecer que envolveu a tutela, a UAUM e o GACMB, decidiu-se avançar com a construção do estádio, cujas obras decorreram entre 2000 e 2003.

Esta decisão, embora estribada nos pareceres referidos, ainda hoje é contestada em Braga. No menu Opinião, está disponível um texto de Ricardo Silva, arqueólogo e coordenador-geral da JovemCoop (Jovem Cooperante Natureza/Cultura), que apelida a ideia defendida pelo vice-presidente da Câmara de Braga, no que à construção e património contemporâneo diz respeito, de “falaciosa” e lembra o caso do novo Estádio Municipal: “Não se pode concordar em construir um estádio de milhões, que raramente as pessoas acorrem até ele (dizem-no desconfortável), destruindo os vestígios do Castro Máximo”. E vai mais longe, observando com alguma ironia a estratégia de marketing do Sporting Clube de Braga, que passa por vestir os jogadores de soldados romanos: “É um aproveitamento inteligente de uma situação que lesou, claramente, o património de Braga”. Aproveita para salientar que a maior parte das marcas romanas existentes na cidade de Braga decorrem da iniciativa privada e critica a Câmara Municipal por não ter um papel mais activo em termos da referenciação pública do património (ver vídeo).

Castro Máximo: tipologia
O Castro Máximo localiza-se na periferia da área urbana de Braga, constituindo um dos pontos mais elevados da cidade (cerca de 200 metros de altura). Encontra-se virado ao vale do rio Cávado e domina a vasta e fértil planície que se espraia pelas duas margens do rio.

Aparece citado pela primeira vez em documentos medievais. Entre os séculos XIX e XX encontram-se inúmeras alusões a achados ocorridos no povoado. No sítio da Geira, refere-se que a descrição do espaço feita por Carlos Teixeira “afirmando a existência de fossos, no lado virado à cidade, admitindo ainda que ele teria duas linhas de muralhas, embora, nessa altura, fosse já difícil seguir-lhes o traçado”. Este autor faz alusão, também, ao aparecimento de vestígios de habitações circulares, em pedra, e considera, com base nos achados cerâmicos e metálicos encontrados, que o povoado não foi romanizado.

Manuela Martins (citada no sítio da Geira), observa que em 1977 e 1978 a UAUM realizou duas sondagens na estação, a última das quais viria a ser sumariamente noticiada. Não obstante as inúmeras referências ao povoado, e apesar dos múltiplos achados e, até, das sondagens realizadas, “é díficil precisar a cronologia da ocupação deste sítio e vislumbrar a sua organização defensiva, ou mesmo considerar com rigor a época do seu abandono”.
O material cerâmico conhecido da estação permite admitir, contudo, uma intensa ocupação entre meados do século I a.C. e meados do século I da nossa era, altura em que provavelmente deverá ter sido abandonado. No entanto, os raros vestígios de louça romana, nomeadamente fragmentos de ânforas e a presença de moedas, “levam a admitir a possível coexistência do povoado com a primitiva ocupação romana do sítio da Cividade”.
Pode ver a localização do espaço no mapa ou obter mais informações através do menú Multimédia.

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